Tive a profunda infelicidade de cruzar-me, por intermédio de um contacto meu, com um post daquela fígura impar da nacional-legislatice chamada Duarte Marques. Não satisfeito de ter levado o bigode da década por parte da Ana Drago, vem hoje tentar encantar mais alguma da juventude social-democrata feminina, certamente ávida de herois e de futuros suspeitos de violência doméstica, afirmando a propósito de um dos manifestantes nos protestos de hoje, o Miguel Reis, que (e cito)
"Porque será que são sempre os mesmos? Cá está o Miguel Reis outra vez. Eu quando apareço digo que sou do PSD, estes tipos do Bloco de Esquerda ou do PCP escondem sempre a filiação. Cá está o Miguel, habitué destas coisas. Invasões, manifs e interrupção de conferências. Tudo teatro bem montado. Este na foto já é mais conhecido que a Catarina Martins do BE"
Comecei por tentar ser leve na resposta, até por me parecer que um discurso elaborado falharia claramente o objectivo de tornar-se útil a Duarte Marques. Desse modo, e ainda num tom construtivo e conciliatório, expliquei que muitas pessoas no próprio PSD preferiam que pessoas como Duarte Marques não se afirmassem do PSD, dado existirem limites para o que podemos considerar "boa publicidade" vinda da "má publicidade".
Contudo, firmemente convicto - como sempre nos tornamos quando nos habituamos à adulação da audiência típica das fábricas de condicionamento mental a que chamamos juventudes partidárias - da sua (vamos chamar-lhe assim) "razão", Duarte Marques entendeu responder a uma outra crítica à sua legitimidade para exercer o cargo de deputado que a todos nos custa o que custa, em que era questionado directamente sobre uma eventual prova de acesso que tenha feito para esse exercício. Respondeu o seguinte:
"não maior prova que aprovação em democracia, pela voz do povo que tantos fingem representar. Por outro lado, o que está aqui em questão não é a prova. Eu próprio considero que a solução poderia ser outra. A questão é o comportamento anti-democrático daqueles que impedem os outros de fazer a prova, daqueles que impedem de trabalhar quem não quer fazer greve. Isso não é respeitar a liberdade".
Muito bem. Ainda que eu tenha toda a consideraçao pelos défices cognitivos dos outros, e me mova a maior compaixão por todos aqueles a quem a constante adulação acrítica convenceu de talentos inexistentes, há duas notas que entendi fazer, e que dirigi directamente a Duarte Marques, como devemos fazer sempre que algo na conduta dos outros nos incomoda:
- não requer particular elaboração compreender que o fenomeno eleitoral em portugal, sobretudo em partidos catch-all como o PSD pretende ser, inclui dinamicas de protesto (o mesmo de que acusam cronicamente o BE) ao ser apresentado como "alternativa a Sócrates", e inclui dinamicas de voto por hábito. A qualquer uma destas duas práticas o conhecimento dos elementos constantes de uma lista, como é o caso de Duarte Marques, é nulo. Logo, a sua legimitidade enquanto "aprovação em democracia" é, basicamente, nula. A menos que estivessemos em processos eleitorais no formato dos circulos uninominais, é um argumento falho de verdade (e de inteligencia) dizer-se representante de pessoas que, objectivamente, não o conhecem e não fizeram por escolhe-lo directamente.
- se é anti-democrática a conduta que impede ou previne outrém de agir, calculo que tenha de afirmar-se pela liberdade da população portuguesa cuja vida diária passou a excluir diversas actividades por acção consciente e premeditada do governo. No mesmo plano está usar o resultado de uma prova imbecil (com questões absolutamente absurdas para a aferição da competencia pedagogica, como uma soma de merceeiro) para impedir o acesso à profissão das mesmas pessoas a quem a entrada nos quadros já é uma miragem por acção ou conivencia legislativa social-democrata. Questão de pura lógica.
Portanto, como o Duarte escreveu tentando ser tão eloquente como um slogan de produtos para a higiene intima, o que o governo faz "não é respeitar a liberdade". Fico, pois, a aguardar o seu grito de Ipiranga. Afirme-se, Duarte: afirme-se. Ou então seja empreendedor, siga a sugestão do seu lider, e aproveite a oportunidade da migração para nos beneficiar com a sua ausencia.
E pronto, era só isto.
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Sou da opinião que nestes tempos de barbárie, a esquerda que quer ser esquerda não deve ambicionar menos do que vencer. Juntar milhares de pessoas em torno de ideias, de um programa e de um movimento popular permanente que sustente uma mudança estrutural na relação de forças em Portugal e na Europa. E para isso a disponibilidade para discussões em torno do que une e do que agrega e em torno de uma unidade que sustente uma verdadeira alternativa política é indispensável.
Há neste aspecto uma proposta do Bloco e do PCP de construção das bases para um Governo de Esquerda que tire Portugal da tirania financeira. Há um PS que pelo que defende e tem aplicado não conta nesta equação. Há uma proposta vaga e populista do LIVRE para unir a esquerda sem um programa de esquerda. E há agora o Manifesto 3D.
Não acho que o Manifesto 3D se possa resumir aos seus proponentes. Ele é o espelho de um sentimento que vai ganhando peso na sociedade portuguesa para mudar este estado de coisas. E gosto de muitas das pessoas que propõe o movimento e de muitas das quais o subscreveram. Muitas dessas pessoas sei que são pessoas honestas, com bons princípios e verdadeiramente empenhadas numa mudança de Portugal e da Europa à Esquerda.
Não acho pois que devam de nenhum modo ser hostilizadas. Até porque propõe o mais razoável: uma unidade na que consiga “recusar a submissão passiva de Portugal a uma União Europeia transformada em troika permanente”.
E se acho que a política se faz em torno do programa este manifesto propõe uma linha política clara no seu texto:
««
- A prioridade é o respeito pela democracia e pela Constituição, impedindo que os interesses da finança se sobreponham aos direitos dos cidadãos.
- Necessidade de pôr travão à austeridade e renegociar a dívida.
- Impedir o sufoco de novos resgates e memorandos, com esse ou outro nome.
- Devolver dignidade ao trabalho, começando por actualizar o salário mínimo e garantir a negociação colectiva.
- Combater as injustiças na distribuição do rendimento e da riqueza, moralizando o sistema fiscal.
- Erradicar a pobreza.
- Afirmar que a saúde, a educação e as pensões não são mercadorias e que o Estado Social não está à venda.
- Preservar o carácter público da água, dos serviços postais e dos transportes colectivos. “
- Também convergimos na vontade de impedir que a União Europeia seja um espaço não-democrático, baseado na relação desigual entre ricos e pobres, credores e devedores, mandantes e mandados
»»
Nove pontos razoáveis. Mas que por princípio tipificam essencialmente aquilo em que estamos contra. Estamos contra esta União Europeia, a austeridade, o memorando e os resgates (com este ou outro nome), a usurpação do sistema democrático pelo sistema financeiro, as desigualdades e injustiças sociais e económicas e a defesa do Estado Social. É por estarmos contra isso que defendemos o oposto: devolver dignidade ao trabalho, afirmar o carácter público dos sectores estratégicos, erradicar a pobreza, proceder a uma renegociação da dívida.
Mas para juntar e para vencer nestas europeias sabemos que não chega. Há pelo menos quatro pontos fundamentais que o movimento 3D e quem nas suas ideias se sente representado deve responder. Dessas respostas depende a sua vitória. E provavelmente a mudança da relação de forças em Portugal.
- Estamos dispostos a assumir que a defesa de Portugal da tirania da finança e a rutura com esta União Europeia pode implicar uma rutura com o Euro para a qual Portugal e outros povos da Europa devem estar preparados?
- Recusamos a proposta de federalismo europeu criando uma União Europeia com ainda maior capacidade de definição vida política dos seus estados membros?
- Temos uma estratégia de construção de movimento popular à escala nacional e sobretudo europeia que sustente a proposta política de rutura com a dívida e a austeridade?
- Concordamos que só é possível implementar uma política deste tipo com uma unidade internacional e internacionalista clara e uma definição apriori de quais são as forças políticas na europa com quem queremos construir uma aliança para derrotar a ditadura do ditat europeu?
Se estivermos de acordo nisto, então acho que temos caminho para fazer em conjunto. Na verdade, construir uma maioria ganhadora em torno deste programa seria provavelmente a mudança mais decisiva na luta dos povos e na luta de classes das últimas décadas.
Não devemos fechar as portas a essa oportunidade.
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Tendo em conta as últimas iniciativas oriundas dos mais diversos quadrantes da esquerda portuguesa no sentido de unir a dita cuja, considero que isto começa a ser demasiada união para tanta esquerda. Nesse sentido, proponho uma série de questões com o objectivo assumido de voltar a desagregar a esquerda de forma a que ela volte a debater ideias e propostas.
- O que fazer à dívida? Rasgar o memorando ou não? Negociar? Caso a negociação não funcione, declarar uma moratória unilateral e preparar o país para sair do Euro? Ficar no Euro custe o que custar? Emite-se uns Euro-Bonds e está feito?
- Propor a extinção da NATO? Tirar Portugal da NATO? Apoiar intervenções da NATO em casos de genocídio?
- Reformar a UE? Defender o federalismo europeu? A austeridade é necessária, mas assim tanta não que já aleija?
- Defender o Rendimento Básico Incondicional, o Direito ao Trabalho para todos e todas ou as duas coisa?
- Condenar todas as ditaduras, as ditas de esquerda e as ditas de direita ou abrir honrosas excepões para os amigos?
- Nacionalizar os sectores estratégicos da economia ou apenas uma participação forte do Estado, sei lá, umas Golden Shares?
- Trabalho sexual é trabalho ou no Socialismo acaba-se a prostituição? As pessoas LGBTQ devem poder adoptar crianças legalmente ou não? Legaliza-se a canábis ou isso é uma cena que aliena a malta da participação na luta? Criminalização do piropo ou direito ao livre piropo?
- Respeita-se a autonomia dos Movimentos Sociais ou é algo que só serve para a malta ir lá recrutar e dirigir?
- Marca-se mais uma travessia da ponte de autocarro, bicicleta ou triciclo?
- Mata-se o Zico com um choque elétrico, uma injecção letal ou um balázio no meio dos olhos? As touradas são um património cultural ou podem-se organizar claques que tenham prazer em ver o Touro a espetar o chifre nos testículos do toureiro?
Poderia avançar com outras questões importantes como a esquerda propor a mudança de côr do facebook ou a criação de um botão de “não gosto”, mas penso que estas 10 temáticas já serão suficientes para manter a esquerda desavinda nos próximos 10 anos, pelo menos.
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