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O que está a acontecer com a avaliação das unidades de investigação em Portugal é absolutamente preocupante. O governo já mostrou com muita clareza que o financiamento a investigadores em doutoramento é para ser aniquilado. E Pires de Lima já mostrou também qual é a orientação: condicionar o financiamento a investigadores e projetos que tenham ligação ao mercado e que dele possam obter recursos. A somar a isto chega agora o processo de avaliação das unidades de investigações. Este processo que continua em curso é um misto de incompetência, negligência e cegueira ideológica. As unidades multiplicam as queixas sobre erros técnicos que facilmente seriam resolvidos caso as equipas de avaliação tivessem realmente especialistas das várias áreas e se estivessem preocupadas em enquadrar e discutir com os avaliados no processo de avaliação.
Mas o caso mais flagrante de cegueira é o do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE-IUL (CIES). Falo de perto porque é um centro de investigação da instituição onde tenho passado os meus últimos quatro anos de formação e onde aprendi muito do que sei sobre as transformações da sociedade portuguesa. Os avaliadores foram incompetentes ao confundirem o CIES (Centro de Investigação) com o ISCTE-IUL (Instituição de Ensino onde ele está sediado) e ao assumirem que o ISCTE-IUL faz parte da UL, fazendo com isso uma comparação entre o CIES e o ICS da UL. Mas o absurdo vai mais longe quando os avaliadores, no auge da sua arrogância, dizem ao CIES que as problemáticas das desigualdades sociais e das migrações “estão esgotadas em termos de publicações” e que o CIES tem de procurar “linhas de investigação mais inovadoras”. Como é que é possível que se faça uma avaliação baseada em preconceitos tão claros, quando as desigualdades, nas suas várias formas, se têm agravado em Portugal e na Europa e quando a emigração é um dos assuntos mais relevantes na sociedade portuguesa nos nossos dias?
O CIES lá foi penalizado por não ceder aos interesses imediatos das agendas ideológicas para a investigação. Já protestou e espero que ganhe o braço de ferro com a FCT. Mas este processo deixa marcas. O governo quer mesmo desmantelar o sistema científico nacional que tantos anos demorou a sedimentar. E fá-lo por razões ideológicas: é preciso calar quem investiga o poder; é preciso financiar quem investiga para o reforçar.