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Crato era o doutor exigência com a missão de exterminar o facilitismo. Era na prova que pretende obrigar os professores a fazer que ia demonstrar o seu excesso de zelo: os professores deveriam ser avaliados uma segunda vez pelos mesmos conteúdos porque a avaliação feita por uma instituição universitária regulada pelo Estado não era suficiente.
Afinal, em vésperas da sua realização, a «prova de avaliação de conhecimentos e capacidades» é amputada da sua componente específica (a que avaliaria os conhecimentos disciplinares necesssários para a realização do seu trabalho) e apenas resiste a componente geral, algo ridículo que só se pode descrever como estando a meio caminho entre uma espécie de PGA e um teste de QI abrutalhado para professores. É um remendo temporário, diz-se, mas é significativo. E é mais uma ocasião para perceber que o discurso da exigência é tantas vezes instrumentalizado por várias outras causas. O que interessa é mesmo realizar a prova e excluir, não o que é avaliado.
A culpa de todos os males da educação era do eduquês vazio de conteúdos disciplinares sérios, não era dr Crato?
"Assim como a orientação denominal de um homem é o resultado de sua educação, e o religioso precisa de um retiro para sua alma, a opinião pública das massas representa nada mais que o resultado final de uma incrível tenacidade e perfeita manipulação de de sua mente e alma"
Portugal é hoje um país que vive numa encruzilhada de tempos. No nosso tempo construímos e conquistámos coletivamente direitos que marcam uma agenda de modernidade civilizacional. Mas foi também no nosso tempo que vimos proliferar um velho conservadorismo bafiento de alguns setores da direita e da sociedade portuguesa que têm efetivado uma verdadeira agenda de atraso civilizacional.
Conquistámos o fim da perseguição das mulheres que recorriam à IVG, mas o Serviço Nacional de Saúde está a ser desmantelado. Conquistámos uma das mais avançadas leis da identidade de género, mas vimos o direito ao casamento por casais homossexuais não ser acompanhado pelo direito à adoção como em qualquer outro casamento. Conquistámos o Ensino Superior Público, mas cada vez menos estudantes têm condições económicas para o frequentar. Conquistámos diversidade de oferta cultural e de públicos, mas deixámos a cultura sem Ministério, sem orçamento e entregue a agendas economicistas. Conquistámos a lei da paridade, mas a violência doméstica e a desigualdade salarial continuam a ter uma marca de género.
Nas grandes disputas da modernidade encontrámos sempre uma barricada com dois lados bem distintos. De um lado encontrámos as forças sociais e políticas progressistas, os setores da esquerda com uma agenda de modernidade e efetivação de direitos. Do outro lado encontrámos sempre o conservadorismo dos setores mais reacionários da direita portuguesa, com um cheiro decadente a atraso e uma estranha nostalgia dos tempos mais podres e miseráveis da nossa história.
É esse o confronto do nosso tempo: um confronto entre quem quer que o futuro seja um regresso ao passado e quem quer que o futuro seja um tempo novo de direitos e liberdades. É esse o confronto que hoje temos pela frente com a JSD e a JP, essas locomotivas de produção de políticos profissionais, de analfabetos políticos que só não são forçados a emigrar porque têm na jota um referencial de emprego para a vida.
A JP aproveitou o Congresso do CDS-PP e o apoio de meia dúzia de secretários de estado do CDS para propor um recuo da escolaridade obrigatória para 9º ano. A JSD, na esperança de mobilizar as velhas ideias conservadoras da sociedade portuguesa, propõe um referendo à adoção e coadoção de crianças por casais homossexuais, achando que os direitos humanos, mesmo que com o apoio maioritário da sociedade, devem poder ser vedados a grupos socialmente discriminados. A JSD e a JP assumem o seu projeto: ter uma sociedade mais desigual, conservadora e autoritária. Uma sociedade onde a maioria deve ter o direito de impedir direitos fundamentais a uma minoria. Uma sociedade com menos qualificação em que o sistema da educação deve ser uma máquina reprodutora das desigualdades sociais.
Vejamos só a título de exemplo a comparação para o ano de 2001 e 2011 dos anos de escolaridade obrigatória numa série de países do mundo:
Figura 1: Anos de escolaridade obrigatória entre 2001 e 2011
Fonte: PNUD
Percebe-se três coisas. Em primeiro lugar, entre 2001 e 2011 ou se mantêm os números de anos de escolaridade obrigatório ou em muitos países aumenta. Em segundo lugar, Portugal está na linha dos países mais avançados na Europa neste domínio, e afasta-se de países de regiões do mundo com menos investimento neste campo. Em terceiro lugar, a Juventude Popular propõe que caminhemos em contraciclo com a maior parte dos países do mundo neste domínio.
A JSD e a JP deitam um cheiro subtil e ainda assim engulhoso a um período negro da nossa história que, em quase meio século de existência, apostou numa sociedade sem escolaridade, altamente desigual e onde a moral e os bons costumes eram os pretextos do conservadorismo mais reacionário.
O que a JSD e a JP propõem é um atraso civilizacional. Puro e duro, sem rodeios. Um cheiro bafiento a tempos dos quais não temos saudade. Um branqueamento mesquinho dos avanços nos direitos e na conquista da igualdade na sociedade portuguesa. A JSD e a JP não estão contentes. Viram uma sociedade que avançou mais do que os cérebros dos seus iluminados dirigentes. Viram que ao contrário das suas ideias mais obscuras, a sociedade portuguesa soube evoluir e lutar. A JSD e a JP estão histéricas. Viram uma sociedade passar-lhes à frente e não ficar presa aos símbolos mais podres que marcaram a nossa história coletiva. Viram que só eles ficaram presos numa nostalgia passadista e rançosa de um tempo cujo povo heroicamente soube ser coveiro.
A JSD e a JP têm de ser derrotadas. A sua derrota é condição de existência de um futuro.