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Nacionalismos de esquerda

por sergiovitorino, em 29.10.13

Como sou de impulsos, assim me estreio por estas linhas, com o desejo de que a malta da tasca recorde que a minha diletância é genética e não ache esta intervenção contraditória com o facto de não escrever nada por lá há meses (e meses antes disso).

Não li o post do Bruno Carvalho mas imagino que não se centra no que me interessa argumentar. Concordo parcialmente com o Alex - "A esquerda deve ter um cuidado redobrado com a narrativa patriótica de forma a não abrir caminho a nacionalismos. E isto passa, em grande parte, por não confundir patritiotismo com soberania popular ou com socialismo" - faço, contudo, notar que HÁ nacionalismos de esquerda - exemplifico com o País Basco, em que o projecto independentista não é propriamente dirigido pela burguesia nacional como, por exemplo, o é na Catalunha. Mas interessa-me mais na realidade mutante de hoje questionar a centralidade agravada e urgente do INternacionalismo como única estratégia possível para fazer frente ao capitalismo financeiro globalizado e tecnológico, e de como essa consciência e prática internacionalista não tem necessáriamente de ser contraditória com uma luta nacional ou local, a defesa de soberania e sobretudo de auto-determinação de um povo.
Certo é que o instrumento do materialismo histórico continua a ser de extrema clarividência se procuramos discernimento, e que onde começa a defesa do estado-nação, da democracia representativa de modelo burguês, da existência de fronteiras nacionais ou de uma homogeneidade cultural/identidade nacional (por oposição ao reconhecimento de um país multicultural e da defesa de todxs xs que cá estão), o branqueamento da luta de classes nacional em nome de um superior interesse nacional, aí sim, termina a esquerda. E parte do dilema da esquerda institucional - toda ela - é compreender os efeitos da sua própria participação no aparelho de Estado, da sua colaboração com o parlamentarismo burguês, até da ideia de concertação social... da sua acomodação, reformismo e confirmação do sistema, face à premência da sobrevivência perante o caos social em que mergulhámos, a urgência das novas soluções de organização, luta, vida "fora do sistema" que o jornal Público tanto temia na sua edição de ontem, ao não conceber nenhuma outra forma de democracia ou acção e empoderamento colectivos, como se ao parlamentarismo burguês - que hoje não é mais do que a fachada de um Estado crescentemente policial e autoritário e que, reconheça-se, nunca foi uma democracia, isso no quadro do capitalismo só se permite de vez em quando e enquanto dá jeito manter as aparências de que o povo tem alguma palavra - não houvesse alternativa possível senão uma solução proto-fascista. Temos de reaprender a viver, como de reaprender a lutar, e não é patriotismo de esquerda se não for primeira e fulcralmente internacionalista, socialista e democrático, como o Che Guevara bem descobriu e por isso não podia continuar em Cuba. Podemos continuar a debater se não há aqui um contrasenso inicial entre patriotismo e internacionalismo - em muitos casos concretos de lutas nacionais, houve - mas independentemente da globalização, continua a haver um plano de luta local apesar do novo plano global, e o capitalismo - ainda que financiarizado - continua a intervir no globo de forma "desigual e combinada". Precisamos de respostas novas e imediatas como da comida que nos tiram do prato, e essas estão onde estão as massas a passar fome, aqui mesmo ao meu lado, ao vosso lado, descrentes do sistema político e do futuro, impedidas de viver e de lutar pela impossibilidade material básica. Só estranha que faltem nas manifestações quem não sente o dia-a-dia cada vez mais difícil, inclusivé o esforço da participação política quotidiana de quem ainda a tem.

De resto, acho que as esquerdas estão igualmente embrenhadas nos seus próprios labirintos (cada uma nos seus), e que o sectarismo crescente só enfraquece, e é tão útil para a luta popular como a ideia de um "governo de esquerda" no contexto da ofensiva ultraliberal - e internacional - actual.

Até daqui a uns meses.

Era a brincar, era a brincar...

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publicado às 07:30




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